20 fevereiro, 2011

O lar do viajante

"Minha alma viajante aliada a um coração independente e sedento pelo novo"
Não importa como classificam os que viajam: "turistas" ou "viajantes", somos todos UM.

É comum que alguns seres humanos classifiquem outros seres humanos segundo os diferentes modos de conduta social de cada grupo. Nada de errado.
Acontece que nem sempre o intuito de enquadrar e definir pessoas segundo seu comportamento se justifica. Pior, frequentemente cria estereótipos e esbanja superficialidades. Classificar a complexidade humana em apenas duas categorias ,seja lá em que gênero for , quase sempre dá nisso.
Há, nesse caos de classificação, um tipo específico  que me interessa discorrer: são os "turistas" e os "viajantes", aqueles estereótipos criados pela antropologia, aquela que define o ser humano em viagem segundo seu comportamento e atitudes e opõe o caráter do turista ao do viajante, resumidamente atribuindo ao primeiro o título "de massa" e ao segundo o de "individual". E de sobra ainda distingue fortemente "viagem" de “turismo”.
"Turistas procuram na cultura local aquilo que se ajuste às suas necessidades.", está é uma das definições mais comuns ao "turista". Segundo o personagem Port - em "O céu que nos protege", de Bertolucci, - “o turista pensa em voltar para casa assim que chega”.
 O turista é tido invariavelmente como aquele que desembarca de um ônibus turístico de dois andares com ar condicionado, compra souvenir em lojas turísticas, anda em grupo, carrega câmeras filmadora e fotográfica, usa roupa de turista (camisa florida, chapéu de safari e chinelos com meia), carrega mapas, come no McDonalds, não se esforça em falar palavras no idioma local e jamais se senta ao lado de um local, mas sempre com seus “semelhantes”. Faz sentido....
No espetacular filme de Bertolucci, os personagens Kit e Port buscam na vastidão do Saara um sentido para suas vidas, novas experiências na esperança de reconstruir as suas próprias vidas e, com isso, salvar um casamento de dez anos, em crise.
Daí, o casal não se considera turista, mas viajante. Diferentemente, o amigo Turner se considera um turista, pois não vê a hora de retornar para casa.
Pessoas são diferentes. E em viagens não fogem à regra. Os espertos tentam categorizar os seres humanos em viagens em apenas duas espécies: a de pessoas “viajantes” e pessoas “turistas”. Baseadas fundamentalmente na maneira como elas se comportam em viagens. É algo que vejo como uma tentativa de enquadrar o universo em um cubo e colocá-lo sobre a mesa....algo patético!!!
Sem dúvidas é possível não apenas definir como classificar grupos humanos, contudo é definitivamente impossível encarar a complexidade dos seres humanos e seu comportamento social de maneira tão simplista e ter sucesso.
Do outro lado estão os "viajantes", aqueles com espírito mais aventureiro, os que procuram situações novas e mergulham mais profundamente na cultura local. São os que viajam com maior autonomia e optam por comer em lugares mais comuns aos locais, não turístics, os que invariavelmente usam transportes públicos e evitam grupos. Bom também faz sentido.
Viajantes aceitam e se ajustam à cultura local da melhor maneira possível. Segundo o personagem Kit, do mesmo filme, “o viajante pode nem voltar”. Estes esforçam-se para comunicarem-se no idioma do país que visitam, sentam-se ao lado dos locais e comem sua comida. Tiram fotos discretamente e não usam guias locais, consultam seus guias de viagens. Viajantes viajariam por curiosidade.
 Não obstante, todo viajante deva ter alguns graus a mais de tolerância e complacência do que tem em sua casa, combinado com uma boa dose de senso comum e ótima dose de senso de humor.
Em minhas viagens não há rotinas, e meu lar definitivamente é o mundo, minha inquietude não me permitiria fixar meus pés num único local, nos últimos quinze anos já passei por pelo menos seis cidades e muitas casas.
Meu equilíbrio vem da sensação de que quem não tem casa, não precisa de coisas para pôr na casa então quando você não tem um endereço permanente, você aprende um novo valor para as coisas, hoje quando vejo algo que me agrada muito contemplo, não preciso possuí-lo; e quanto mais coisas belas eu vejo , menos necessidade  tenho de  possuí-las  porque de alguma forma eu passei por elas e elas passaram por  mim.
Uma casa é apenas um teto para proteger tudo aquilo que vamos acumulando durante a vida e quanto mais acumulamos maior tem de ser a casa, eu sei é uma visão simplista e restrita  mas faz sentido para mim que tenho rodinhas nos pés e que entre comprar algo para  minha casa ou investir numa viagem sempre acabo escolhendo a segunda opção.
Gosto de ter um lar tão amplo que cada noite possa dormir num jeito diferente de ver o mesmo céu, com tantos familiares que cada tarde possa conversar com alguém diferente, num idioma diferente, e que eu com tantos hábitos e rituais arraigados a cada dia possa aprender algo diferente, é essa minha visão de lar doce lar: o mundo.

03 fevereiro, 2011

Árvore de amizade

Semana passada combinei com uma amiga de almoçarmos juntas num rstaurante natureba charmosíssimo a algumas quadras de casa, o máximo que conseguimos ir nos fins de semana em que a preguiça reina.
A cada passo entremeando nossa conversa , num tema da qual não tenho o menor gabarito ou  experiência para opinar , pensei em amigas e amigos que comigo atravessam décadas acompanhando os acontecimentos: formaturas, casamentos, filhos, uniões, separações, novas uniões, caminhos definidos por carreiras, renovação de projetos de vida.
Nessas conversas ainda que não saibamos ao certo o que dizer, creio que o carinho que temos pelo outro nso ajuda a oferecer encorajamento para as mudanças necessárias, alento para a frustração de tudo que não acontece como gostaríamos e sobretudo o suporte amoroso para amparar a dor das perdas.
Com a autorização da intimidade cultivada, nos sentimos livres para dizer coisas difíceis de ouvir, questionar crenças e valores arcaicos infundados e principalemnte desmascarar hisorinhas de auto engano.
Essa teia que se forma na amizade, se tece com todas as nuances das trocas:  de receitas, de casos engraçados, de kill Bill a Goethe, de reflexão sobre temas importantes, médicos, cosméticos, endereços úteis, sugestões de viagens.
Me emociona a combinação dos olhares de cada um, fato recente que pude observar no meu último aniversário, e é através desse caleidoscópio  que oferece vários ângulos para uma mesma situação que permite que nós reescrevamos histórias, reassumimos posições, reerguemos, agimos de outro modo, fazemos mudanças, aventuramos em trilhas desconhecidas, ousamos, recuamos.
Principalmente transformamos dramas em comédias porque a mão amiga que nos acolhe quando nos desfazemos em lágrimas, é a mesma mão que depois de digerida a desilusão nos acode para rirmos juntas das cenas passadas.
A confiança que sustenta essa teia da amizade nos permite acolher o modo diferente de vivenciar situaçãoes nas quais nos envolvemos e nos encoraja a reavaliar o que fazemos ou sentimos.
Com a certeza de receber compreensão  e aceitação revelamos segredos que  nos envergonham  ou nos amedrontam.
Os amigos de longa data guardam valiosos fragmentos de memória perdidos em nós, nestas conversas recuperamos peças de quebra cabeça que nos ajudam a compor a imagem mais nítida da nossa própria vida e assim vamos envelhecendo sabiamente juntos na estrada do tempo.